O Sequestrador

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//Entrevista com o Cimento, o suposto sequestrador//




/1/ Caro Cimento, há uma polêmica atual te apontando como um sequestrador? 


Veja bem, não se trata do sequestro violento de pessoas, para  extorquir  familiares  exigindo vultosas quantias de dinheiro. Eu sei que durante décadas o meu nome foi associado com  o  crescimento desordenado das cidades, sendo que um  dos maiores símbolos são as  construções feitas com muito concreto (eu sou um dos integrantes mais importantes do tal concreto)  e nenhuma integração com a natureza (sendo a indústria do cimento responsável por até 7% da emissão de dióxido de carbono, hoje em dia). Este crescimento desordenado  das  metrópoles acabou por desmatar o entorno rico  em verde de um precioso ecossistema, que atualmente está  muito ameaçado (um exemplo claro é a  Mata Atlântica). Mas te garanto que o sequestro atual é para o bem.












/2/ Como assim?


Sempre admirei os projetos que me empregaram de forma sustentável. Exímios e visionários arquitetos construíram casas, prédios, escolas, templos  etc., que harmonicamente se integraram ao espaço natural em volta, em uma relação mutualista de preservação natural. Um exemplo que sempre gosto de citar  são os projetos orgânicos  do arquiteto modernista norte-americano Frank Lloyd Wright. Então, esta prática sustentável  seria o outro lado da moeda da minha utilização (distante das construções desplanejadas e insustentáveis das selvas de pedra poluídas de  inúmeras grandes cidades). Sendo assim, contra  os malefícios do aquecimento global, atualmente, fiz parceria com uma tecnologia verde, entrando nesta empreitada como  um agente sequestrador do CO2 (Dióxido de Carbono) - que é um dos principais elementos que contribuem para o aumento da temperatura global, através do efeito estufa. Acho que vou conseguir aprimorar o meu lado ecológico, ao sequestrar do ar as moléculas de dióxido de carbono.













/3/ Como funciona este processo de sequestramento de carbono?



Através de uma nova técnica de fabricação de cimento (isto é, da minha fabricação). No procedimento atual de cura utilizado pela indústria do cimento, uma reação química (desencadeada pela combinação da água com o cimento viscoso) gera no final do processo um cimento enrijecido. Já a nova técnica é diferente e  está  sendo coordenada pelo cientista Romildo Dias Toledo Filho (professor do Programa de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Esta técnica traz a novidade de se utilizar da reação química de carbonatação: no processo de cura do  cimento dentro de uma câmara com CO2, o hidróxido de cálcio presente no cimento (meu "chapa" de longa data) sequestra o vilão da história (CO2), formando através da reação (e ótima tática policial) o carbonato de cálcio (que é a prisão do CO2).         
















/4/ Há alguma previsão de quando você - Cimento Ecológico - estreará no mercado com esta nova roupagem?



Olha, o procedimento ainda precisa passar por mais algumas experiências, como, por exemplo: a quantidade de CO2  que o cimento  pode resgatar durante os testes de laboratório [processo que começa quando o cimento pastoso (no momento em que sou bebê)  é colocado dentro da câmara de gás]. Este processo de cura pode demorar horas ou até dias (dependendo da composição do cimento). Ainda é um desafio estabelecer qual  é  o melhor momento para se fazer o procedimento da cura.














     




/5/ Esta sua nova composição sem dúvida é bem saudável. Que outros cuidados você costuma ter com o meio-ambiente.


Um cuidado que acho fundamental  e que está inserido neste novo projeto sustentável é a substituição de recursos naturais finitos por outros recicláveis e limpos (em fase de pesquisa). Estou diminuindo muito a minha pegada ecológica, ao substituir materiais de minha composição, como pedras e placas de árvores, por  fibras naturais: coco, juta, sisal (que são mais resistentes que as demais fibras e excelentes para a fabricação de um cimento mais reforçado). Assim, fico mais forte, saudável e parceiro da natureza. Com isso, poderei dormir sossegado nas linhas  sinuosas de uma construção amiga e integrada ao meio ambiente. 

















/6/ Qual é a sua visão para o futuro?



Tenho a obrigação de contribuir para estancar o atual processo destrutivo em que o Planeta se encontra. Estamos passando por um período de ganância egoísta e consumista que relega a bioversidade  a um papel de  mera  serviçal do insaciável apetite humano, que  visa, em incontáveis casos,  somente à riqueza material e ao acúmulo de poder. Este modelo não é sustentável e levará  a Terra ao colapso  se continuar do jeito que está. É por isso, que práticas autossustentáveis  e de congraçamento com a natureza são a única possibilidade de se manter um Planeta viável para uma futura vida equilibrada. Sei que tenho a minha culpa no cartório (quase todos eles são de concreto), pois fui muito utilizado (e continuo a ser) em construções horrendas, inimigas da natureza (por solapar o entorno) e movidas exclusivamente pelo motor do lucro ganancioso e rápido. É por isso que vejo como fundamental esta minha nova essência mais amigável com a natureza. Afinal, o concreto (de que faço parte) é o material de construção mais usado do Planeta, e precisa mais do que nunca ser sustentável para absorver o impacto ambiental do crescimento econômico desenfreado de países que fazem parte da economia emergente. E, espero que, logo, surja um produto totalmente natural para me substituir (afinal, tenho em minha constituição minério de ferro, argila, calcário e gesso - elementos que são finitos). Enquanto isso, pretendo evoluir cada vez mais pelas ações de pessoas que realmente se mostram preocupadas com a preservação dos ecossistemas e com o futuro.      
















/7/ O que gosta de fazer para relaxar de seu cansaço estrutural?



Antes de mais nada escolhi um lugar tranquilo para morar, que é um dos símbolos da arquitetura orgânica, ao promover uma interação harmônica com a natureza (se  integrando horizontalmente  com os topos das colinas da região). O local é uma construção que fica em San Rafael - Califórnia, no Condado de Marin. Foi projetado por Frank Lloyd Wright e se chama "Marin County Civic Center" - uma construção concluída em 1969 e que passou admiravelmente bem pelo teste do tempo, pois  até hoje se mantém moderna e atemporal.
Para espairecer, procuro sempre assistir a filmes, ouvir música e ler sobre os mais diversos assuntos, com destaque para a cultura oriental,  mitologia celta e poesia concreta. 
Assisti a cenas de alguns filmes que foram rodados nas partes internas e externas do "Civic Center", e, certamente, a utilização das  linhas modernas desta construção nas  cenas arrojadas e sofisticadas de filmes como "Gattaca" e "THX" oferecem um forte e inigualável  impacto estético e emocional. Sem dúvida, a essência libertária dos dois filmes se projetam nos espaços amplos, angulosos e abertos do "Centro Cívico".       















Com relação à música, presenciei um grande show de rock no "Marin County Civic Center", em 1974. Até hoje, costumo ouvir esse excelente trabalho que é o "Frampton Comes Alive". As músicas deste disco ao vivo envelheceram muito bem e não soam datadas. Gosto muito de  uma faixa curta, agradável e instrumental (que lembra muito o trabalho acústico do guitarrista Steve Howe): Penny for Your Thoughts











/8/ Muito obrigado pela entrevista.


Eu que agradeço e um firme abraço.


















//COORDENADAS//
/Fonte da Matéria/ Débora Motta (FAPERJ).
/Outras Fontes/
/Wikipédia/
/Coleção Folha Grandes Arquitetos - Volume 1/
/Imagem de Abertura(1)/ Cena do filme futurístico "THX" (1971), de George Lucas (Fonte: Site - Movie Goods). Também os prédios do "Marin County Civic Center" serviram de inspiração para as construções que aparecem no Planeta Naboo, da série "Guerra nas Estrelas".
/Imagem(2)/ O foguete do filme "Gattaca" (1997) - uma fábula sobre a superação humana. Abaixo, outro pôster do filme (Site - Movie Goods).









/Imagem(3)/ Vista panorâmica do "Marin County Civic Center", cuja obra se assemelha a uma nave espacial (e é um complexo que engloba o Palácio da Justiça, uma  biblioteca central, o prédio dos correios e os escritórios administrativos).
/Imagem(4)/ Ethan Hawke como o protagonista do filme "Gattaca".
/Imagem(5)/ Vista panorâmica lateral do "Marin County Civic Center" (Foto - Scott Zimmerman).
/Imagem(6)/Cena, que se passa no interior do "Civic Center", do filme "Gattaca".
/Imagem(7)/ Espaço interno do "Civic Center", que é uma espécie de claraboia (Site - buckwildbill).
/Imagem(8)/ Janela que oferece  uma visão da torre, no "Civic Center" (Site - Trip Advisor).
/Imagem(9)/ Panorâmica esverdeada do "Marin County Civic Center" (Site - Lotus - General Contractors Inc.).
/Imagem(10)/ Cena do casal do filme "Gattaca" em  uma passarela de concreto.
/Imagem(11)/ "Civic Center" visto de cima (Site - buckwildbill).
/Imagem(12)/ Escadaria do "Civic Center" que aparece no filme "THX 1138" (Site - Motive Art).
/Imagem(13)/ "Nave Espacial"  e  piscina do  "Civic Center" (Site - Libray Sonoma Education).
/Imagem(14)/  Pôster do filme "Gattaca" (Site - Movie Goods).
/Imagem(15)/ Pôster do filme "THX 1138" (Site - Movie Goods). 
/Imagem(16)/ Encarte interno do disco "Frampton Comes Alive" (1976) (Site - Free Covers).
/Imagem(17)/ Torre e "Nave Espacial" do "Marin County Civic Center" (Site - Tchain).