O Ilusionista

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Na virada da década de 1950 para a de 1960, qual seria o destino de um mágico de talento?
Com novidades surgindo na sociedade como a televisão, as bandas de rock e o crescimento do consumismo (com o aparecimento de novos produtos e de grandes magazines), a capacidade do ilusionista de encantar platéias teria perdido a sua magia?






Na animação "O Mágico" (L'Illusionniste) (2010), do diretor Sylvain Chomet, este desbotamento da profissão de mágico é mostrado através de uma atmosfera de melancolia poética alicerçada por um desenho animado perfeito e de grande beleza em seus traços e no detalhamento de cenário (para cada quadro, tem-se a vontade de dar uma parada na imagem para contemplar a sua profusão de pormenores). 
De tão bem feita e convincente que é, chega-se a um momento em que surge a sensação de que esta animação se transformou em um filme de personagens reais.





      

Em Edimburgo, o mágico tenta a sorte. A beleza plástica desta animação é um primor (c0m uma riqueza de detalhes inacreditável).



O filme aborda a saga do ilusionista Tatischeff, que excursiona por várias cidades, com o objetivo de conseguir emprego como mágico. Como o cenário, em fins da década de 1950, é adverso para este tipo de profissão, o mágico vai encarando performances em lugares cada vez menos glamourosos e  relevantes (teatros pequenos, tabernas, festas particulares etc.).






  

Tatischeff (nome em homenagem ao cineasta Jacques Tati, cujo roteiro original serve a este caprichado desenho animado) segue em frente e firme na sua odisséia em manter acesa a magia do ilusionismo. No entanto, o tempo é de mudança e sua mágica deixa de ser novidade para  ceder espaço  a  fenômenos populares de massa, que acabam por lançar inéditos paradigmas.







Como é o caso do rock, que no começo da década de 1960, faz grande sucesso e se torna fenômemo de massa. Com esta transição cultural,  ocorrem substantivas mudanças sociais. O encanto do ilusionismo que pede o tempo do paciente espectador para observar e se concentrar nos pormenores da  magia cede lugar a manifestações culturais mais fugazes, aceleradas e de celebração para grandes multidões (Rock and Roll, por exemplo).






            

Tatischeff procura novos caminhos de sobrevivência, seguindo o conselho de seus colegas acrobatas (que se transformam em pintores-ginastas de outdoor).  





A publicidade surge também como uma forte e eficaz ferramenta para promover novos produtos (agora mais sofisticados e símbolos de status), que são vendidos em grandes lojas mais bem estruturadas e requintadas (do que no passado). A formatação das vitrines passa a ser mais cuidadosa e engenhosa para atrair os consumidores. É o fenômeno capitalista se solidificando com as suas estruturas ágeis, objetivas, consumistas e fetichistas. 
Que espaço teria um experiente e competente mágico neste começo de sociedade acelerada e sem tempo e paciência para fruições mais demoradas?





Para adaptar a sua mágica a um novo cenário social e econômico, Tatischeff vai literalmente para a frente de vitrines com o intuito de promover produtos, com o uso de sua técnica de ilusionista [tal como, fazem os acrobatas (colegas de hotel do mágico) ao  se  valerem de  suas  habilidades de  malabaristas para pintar outdoor].   
O mágico sabe que as mudanças no mundo são irreversíveis, mas com serenidade e  força de vontade não abandona o seu ofício.














Mas Tatischeff tem um grande problema com um de seus principais trunfos de mágica. O seu coelho oferece grande resistência para sair da  cartola do ilusionista (no momento em que é puxado). E quando, desconfortavelmente, sai, tem o desplante de morder a mão do seu dono. 
Talvez, esta atitude do coelho represente uma metáfora de que o tempo dos grandes mágicos já está ultrapassado (quando o principal animal símbolo do ilusionismo não mais respeita o próprio mágico).









Com toda a dificuldade inerente em relação a sua permanência como profissional da mágica em uma nova realidade, Tatischeff, quixotescamente, persegue novas possibilidades em diferentes países. De  Paris, vai para Londres e, em seguida, para a uma ilhota na Escócia. Finalmente, fixa residência em Edimburgo [para seguir a profissão de mágico nato (antes de se enveredar por outros "bicos")].






  


É em Londres que Tatischeff recebe em uma festa particular (atuando com mágico) o convite de um típico escocês para se apresentar em sua taberna, em uma ilhota na Escócia.







       

 A ilhota escocesa aonde Tatischeff  apresenta o seu ilusionismo. 





       

O mágico é recepcionado pelo amigo escocês. 
O desenho da animação é de alta qualidade, lembrando os traços apurados de Hergé.     



Assim, o ilusionista aceita o convite e continua a sua vida de magia em novos ares. E, em um lugar mais distante das metrópoles e portanto, com maior possibilidade de se deixar encantar por um mágico.








 É  na taberna de seu amigo escocês que Tatischeff faz os seus números de mágica. Resultado: é acolhido, calorosamente, pelos aldeões, que ficam surpresos com a sua habilidade. Mas depois, uma ameaça - que parecia distante do mágico - surge no local como uma grande  e ruidosa novidade de entretenimento: uma caixa de jukebox carregada de músicas rockeiras.






Na taberna, Tatischeff conhece uma menina (Alice), que se encanta com o ilusionismo do mágico. Ela se torna a sua fiel escudeira, acompanhando-o  em sua epopéia magicista.






Depois da  turnê na taberna, o próximo destino é Edimburgo, lugar aonde Tatischeff batalha para continuar a sua vida de mágicas. Nesta nova jornada, tem a companhia da menina Alice, que se torna motivo de alegria para ele. E também, de superação, pois sabe que não pode desapontá-la, afinal de contas, ela está sob o feitiço da habilidade magicista de Tatischeff. Agora, a turma aumentou: o próprio mágico quixotesco, a fiel escudeira e o coelho teimoso.














O objetivo do ilusionista em Edimburgo é o de convencer promotores para apresentar seus passes de mágica em teatros. Com dificuldade, consegue espaço em pequenos teatros para dar prosseguimento ao seu show, que ele luta para que não seja banido.





      

A nova realidade de mudança social acaba por lançar Tatischeff ao ocaso. Seus números de encanto são apresentados, mas não por muito tempo.





      

O mágico tem plena consciência que o seu talento não move mais moinhos. Não amaldiçoa a nova realidade, encarando-a com maturidade e equilíbrio.





      

            Quarto do hotel "Little Joe'', em Edimburgo.



A menina Alice é a nova realidade (o reflexo da atual sociedade). Ele a recebe com carinho e amizade.
E, com relação ao coelho desobediente e teimoso (talvez represente o seu passado e  a  sua condição psicológica) também nutre afeto.
No hotel "Little Joe", aonde se hospedam, fazem novas amizades com um ventríloco, um palhaço e os acrobatas (já citados). Personagens que representam agora o passado, e como os donos do hotel, são criaturas "diminutas" neste novo choque de realidade.






       

Tatischeff, o grande ilusionista, que faz a alegria de muitas pesssoas, com destaque para Alice. Para este tipo de magia, só existe uma palavra precisa: atemporalidade.







                                         

                                                              
Pôster original do filme.









O conteúdo do álbum Presto (1989) é de canções que são uma mistura competente de pop-rock com hard rock e pitadas de progressivo, equacionadas de maneira harmoniosa e criativa.
Destaque para a faixa Presto, que com a sua varinha de condão musical faz a cartola levitar e os vários coelhos saírem com a maior naturalidade dela, para ouvirem esta bela e mágica balada musical.









COORDENADAS
//O Mágico (L' Illusionniste)//
/Gênero/ Animação colorida quase sem diálogos.
/Diretor/ Sylvian Chomet.
/Roteiro/ Sylvain Chomet /baseado em roteiro inacabado de Jacques Tati/
/Trilha Sonora/ Sylvian Chomet.
/Ano/ 2010.
/Duração/ 80 minutos.
/Países/ França e Inglaterra.
/Classificação/ 12 anos.